Ao contrário do que muitos podem pensar, as relações extraconjugais podem, a depender de sua configuração, gerar direitos previdenciários e sucessórios.
De pronto, uma simples relação entre amantes, não é capaz de gerar quaisquer efeitos jurÃdicos e tampouco patrimoniais. Contudo, cumpre ressaltar que na hipótese desta mesma relação vier a constituir um núcleo familiar, ainda que simultaneamente ao casamento, os efeitos poderão ser diferentes.
É preciso certificar-se se este relacionamento extraconjugal possui caracterÃsticas de uma união estável, seja através de uma união pública, contÃnua e duradoura, seja através da constituição de uma famÃlia paralela.
Cumpre ressaltar que, mesmo na hipótese da amante ser reconhecida como companheira (extraconjugal), esta não possuirá direitos patrimoniais, como possui, de sua parte, a esposa. A materialização dos direitos patrimoniais da amante se dá, somente, com o falecimento do seu companheiro, e tão somente sobre a cota parte dos bens deste, que tiverem sido adquiridos, a tÃtulo oneroso, na constância da união estável paralela, não alcançando os bens anteriores, a esta.
Assim, caso seja configurada e comprovada a união estável, entre a amante e o marido falecido, esta terá direito à meação dos bens, como cabe aos companheiros, bem como o direito à herança dos bens adquiridos na constância desta relação paralela. Neste sentido, terÃamos que, na hipótese do falecimento do marido/companheiro, metade dos bens pertenceriam à esposa, sendo a outra metade repartida, em partes iguais, entre o marido falecido, e a amante/companheira.
O Supremo Tribunal Federal tem avaliado os efeitos jurÃdicos previdenciários, nos casos de união paralela, pautado no princÃpio da boa-fé, reconhecendo direitos, através de recursos de repercussão geral, nos casos de união estável concomitante, em geral somente para a primeira união estável constituÃda.
Vale dizer que o Supremo Tribunal Federal, igualmente, possui julgados em favor da concessão de benefÃcios previdenciários a amantes, que não possam ser equiparadas a companheiras.
Há, ainda na Suprema Corte, um julgamento, atualmente suspenso, o qual pode vir a mudar o entendimento sobre esse assunto a fim de proteger os direitos das partes envolvidas, nas mais diversas configurações familiares, com a possibilidade de elevar o concubinato ao status familiar.
A proposição de novas concepções familiares tem sido cada vez mais comum, seja em demandas judiciais, seja em procedimentos administrativos com o fim de obter-se a concessão de benefÃcios de pensão por morte, por aqueles que alegam terem sido companheiros do de cujus, criando as mais diversas disputas previdenciárias entre viúvos e concubinos.
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, foi alterado, de forma significativa, o conceito de famÃlia, deixando, este, de ser exclusivamente de natureza matrimonial, ampliando-se a proteção da famÃlia, quer sejam originadas do casamento, ou advindas de uniões estáveis e, até mesmo, aquelas de configuração monoparental.
O Código Civil de 2002 recepcionou estes preceitos constitucionais ampliando o conceito de famÃlia a fim de abarcar toda a sua pluralidade, com base no afeto e no animus familiae, outorgando-lhes toda a proteção Estatal.
De fato, o pluralismo familiar abrange, hoje, novos modos organizacionais de células familiares, em todos os seus aspectos, já tendo sido reconhecidas pela Jurisprudência, aquelas de ordem monoparental, homoafetiva, aparental, mosaico, extensa ou ampliada, a eudemonista e as paralelas ou simultâneas.
No caso em tela, as famÃlias paralelas ou simultâneas, apesar de serem uma realidade mais comum do que podemos imaginar, sejam elas constituÃdas por uma famÃlia matrimonial e uma união estável ou até mesmo duas uniões estáveis é, ainda, uma forma invisÃvel ao mundo jurÃdico, carente de estudo e discussão.
Faz-se importante destacar a diferença entre famÃlias paralelas, união estável e concubinato!
Segundo o disposto no Artigo 1.727 do Código Civil, é concubinato toda relação não eventual entre o homem e a mulher, impedidos de se casarem.
Por outro lado, a união estável é constituÃda na forma do Artigo 1.723, do mesmo Diploma, ou seja, entre pessoas que preencham os requisitos para o casamento, excetuando-se, entre companheiros casados, o fato de estarem separados de fato de seus respectivos cônjuges.
A seu turno, o concubinato, tendo em vista sua caracterÃstica ilÃcita, por se consubstanciar em relações de convivência ilegÃtima, como as ocorridas paralelas ao casamento, não tem amparo legal, salvo nos casos em que for evidente a boa-fé.
Contudo, não se pode esquecer que a partir da Constituição de 88, as famÃlias constituÃdas a margem do casamento passaram a ter o status de união estável, e as chamadas famÃlias paralelas passaram a ser reconhecidas como concubinato.
De fato, atualmente, esta nomenclatura é considerada altamente discriminatória, apesar de constar, expressamente, como já informamos, no Artigo 1.727 do Código Civil, como definição para as relações eventuais entre os impedidos de contrair matrimonio. Contudo, tal denominação não se mostra, mais, adequada por trazer, em si, uma enorme carga de preconceitos.
Ainda, faz-se necessário diferenciar as famÃlias paralelas das relações extraconjugais, como o relacionamento que não pode ser caracterizado como uma união estável, por não instituir uma entidade familiar. Estes relacionamentos, mesmo que duradouros, não constituem famÃlia e muitas vezes, nem existe o interesse para tal, assemelhando-se à figura do namoro qualificado. Diferentemente, na famÃlia paralela há a caracterização de um núcleo familiar, mesmo que paralelo e simultâneo a outro.
Neste sentido, vemos que a abordagem legal e jurisprudencial quanto aos relacionamentos e seus efeitos, vem adotando uma estratégia com o fim de relativizar a monogamia e até mesmo o seu caráter heterossexual original, a fim de abarcar outras formas de união, com o fim de proteger, sobretudo, os filhos advindos, destas.
Esta postura, pelos Estados Ocidentais, visa, antes de tudo, dotar seus cidadãos e cidadãs da liberdade necessária a ligarem-se e a desligarem-se, em vÃnculos formais ou informais, na sua mais livre expressão de emoções e sonhos de vida, protegendo os seus descendentes e o seu patrimônio, na plena aplicação do princÃpio da dignidade da pessoa humana.